Deito-me por cima do encosto do sofá de lona, com a cabeça afundada no assento. Fico assim a olhar para o tecto lisinho e passeio por entre as portas abertas, de pernas para o ar e sigo a dança das sombras dos ramos das árvores da rua, projectadas sobre o tecto branco. Na boca seguro um lápis que tento equilibrar sem o auxílio das mãos. Não há mobília a atravancar o quarto. E nem pó. E, se eu quisesse, podia encher o quarto de água e fazer uma piscina.
As fissuras da tinta branca deste quarto a pingar de tempo traçam caminhos tortuosos na minha mente. E, sem que eu queira, a minha mente é transportada, por este mapa de tempo e idade, para a minha infância esquecida, onde eu deitava-me sobre a relva e contemplava os céus e as nuvens. As tardes que se estendiam até ao limiar do tempo. E a altura em que podia sonhar sem ter que me preocupar. Tardes nunca mais sentidas pela minha pele. Tardes nunca mais apreciadas com a inocência e honestidade de uma criânça que descobre o mundo, espetando paus nas termiteiras por curiosidade em saber que reacção teriam. Tardes em que corria sem a preocupação de cair e esfolar o joelho. Tardes em que conduzia as cabras pelo terreno fora. Tardes em que corria com os cachorros, cambaleando pelo relvado fora de tão novos. Tardes em que descobria animais novos e estranhos. Tardes em que dava banho ao elefante de circo perdido com uma mangueira verde. Tardes em que, quando vinham as tempestades lá no fundo, no horizonte da savanna, me sentava a comer um gelado antes da tempestade atingir a casa e ficava a contar os relâmpagos.
E sinto no mais profundo do coração a saudade. A saudade em que a vida me apaixonava. A saudade de descobrir as coisas pela primeira vez.
E uma lágrima escorrega quando me apercebo que o que preciso é de sentir tudo pela primeira vez de novo. Renascer.
Fim do blog
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Devido a recentes actividades ilícitas de certas pessoas da Internet, sou
forçado a terminar este blog e a retirar todos os meus poemas da net.
Se há coisa...
Há 14 anos
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